Tiroteio policial mata estudante negro em Rio e reacende debate sobre racismo estrutural

Os fatos
Na madrugada de 24 de fevereiro de 2025, Igor Melo de Carvalho, 31 anos, saia do bar Batuq, onde trabalhava como atendente, a bordo de uma moto‑táxi. Por volta das 01h30, a corrida seguia tranquila quando Carlos Alberto de Jesus, policial aposentado, começou a perseguir o veículo. O motivo? A esposa de Carlos alegou que o motociclista teria roubado seu celular às 23h da noite anterior.
O problema apareceu quando as câmeras de segurança do bar registraram Igor ainda no balcão às 01h20, nada de roubo. Mesmo assim, Carlos avançou em seu carro, disparou várias vezes e acertou Igor nas costas. A bala atravessou órgãos vitais: rim, baço, intestinos e estômago. Igor foi socorrido e encaminhado ao Hospital Estadual Getúlio Vargas, onde ficou em estado crítico por quase um mês.
Durante a internação, ele perdeu um dos rins e passou por cirurgias múltiplas. Apesar da gravidade, Igor recebeu alta e segue se recuperando, mas ainda sente as sequelas físicas e o trauma psicológico que o disparo deixou.
Inicialmente, tanto Igor quanto o motociclista, Thiago Marques Gonçalves, foram presos. Na manhã de 25 de fevereiro, a Justiça revogou a prisão de ambos, alegando falta de provas que justificassem a detenção. Enquanto isso, as investigações se aprofundaram para entender como uma queixa de roubo improvisada levou a um tiroteio policial sem fundamento.
Repercussão e consequências
O caso rapidamente saiu das manchetes locais e ganhou força nas redes sociais, onde ativistas denunciaram mais um exemplo de racismo institucional no Brasil. A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, prometeu acionar o governo do Rio e o Ministério da Justiça para que o caso fosse investigado com rigor. "Queremos jovens negros vivos, livres, não alvos de injustiças raciais", afirmou a ministra em entrevista.
No âmbito legislativo, a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e da Cidadania da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio) passou a acompanhar de perto o processo. A deputada Dani Monteiro, presidente da comissão, questionou: "Quantas vezes vamos permitir que a bala dispare primeiro e a explicação venha depois?" Ela também ofereceu apoio à família de Igor, disponibilizando assessoria jurídica.
Em abril de 2025, o Ministério Público do Rio de Janeiro solicitou a prisão preventiva de Carlos Alberto de Jesus, alegando risco de fuga e de interferir nas investigações. O pedido ainda está em análise, mas já evidencia a seriedade com que a promotoria está tratando o caso.
Para a comunidade negra de Penha e de toda a cidade, o episódio reacendeu o debate sobre a necessidade de reformas no treinamento policial e de políticas públicas que combatam o preconceito racial. Organizações como a Pastoral do Menor e o Instituto de Justiça e Cidadania já propuseram projetos de acompanhamento psicológico para vítimas de violência policial, além de campanhas de conscientização nas escolas.
Enquanto o processo judicial avança, Igor Melo tenta retomar sua rotina de estudos e trabalho, carregando a esperança de que sua história sirva de alerta para que outras vidas não sejam perdidas em situações semelhantes.